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terça-feira, 26 de outubro de 2010

PEREGRINAÇAO OU LOUCURA

 Cena de teatro em que um peregrino ou louco  caminha carregando um enorme saco às costas e vai gritando, gesticulando:

- Vosso amor é limitado a um círculo íntimo de parentes ou de amigos e todos os demais são indiferentes para vós. Se amardes apenas os que vos amam, que recompensa tereis, uma vez que as pessoas de má fé também amam aqueles que as amam? Amai muito para serdes amado, já dizia João, O Evangelista. Se houvesse amor entre os homens, a caridade seria melhor praticada, mas seria preciso que vos esforçásseis no sentido de libertar os vossos corações dessa couraça, a fim de ficardes mais sensíveis ao sofrimento do próximo. Olho por olho, dente por dente, pois eu vos digo: pagai o mal com o bem. Coloca a tua espada na bainha, pois aquele que matar pela espada, pela espada morrerá. De fato meus amigos, que coragem, é essa, nascida de um caráter violento, sanguinário e colérico, que reage à primeira ofensa?
Não julgueis, se não quiserdes ser julgados, porque a letra mata e o espírito vivifica. Por que vedes um argueiro no olho do vosso irmão, vós que não vedes uma trave no vosso? Ide vos reconciliar com vosso irmão antes de apresentar vossa oferenda...
Não basta portanto, ter aparência de pureza; é preciso, antes de mais nada, ter a pureza de coração.
Jesus não disse exatamente que o reino de  Deus é para as criancinhas, mas para aqueles que se lhes assemelham.
Já lhes disse que os povos quáreis no Saara também não tem casas, pois suas casas são seus túmulos. E os homens errantes sabem onde vão chegar, mas nunca chegam...
É preciso partir, sair em busca, fazer uma opção, para, depois que tiver deixado, é aí que se reencontra consigo próprio  ....é assim o homem."

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

CARTA À BELINHA



Queridas e queridos leitores! Com esta carta ficcional eu participei do 1º Concurso Guemanisse de Cartas, e lá estava ela, entre as 150 selecionadas das 1230 inscritas. Legal, né? Obrigada por me apoiarem.




Piracicaba, 05 de agosto de 2010.

Querida amiga Belinha; como está a vida aí? Espero que esta a encontre com muita energia e plena saúde. Eles estão fazendo muito barulho aí? Cuidado com os latidos! Aqui na nova república, na qual compartilho com duas estudantes, as coisas estão caminhando, apesar de alguns obstáculos na adaptação.
            Dois anos já se foram e eu sinto tanta saudade de você, querida Belinha! Mas tenho que continuar meu tratamento de saúde e meus estudos. Sabe?! Às vezes me pego pensando em meus amigos e amigas de outrora. Uns sumiram, outros me comunico só por e-mail ou torpedo, outros raramente, encontro no Orkut; mas, pessoalmente mesmo, só tenho visto você e Fabíola, a cada seis meses. Nesses dias de extremo frio, em que os pensamentos se agitam apesar do congelamento corporal, lembro de nossas estripulias. Juntas, mais que irmãs, compartilhávamos das brincadeiras e das decepções de criança e de adolescente.
            Brincar de bola e pega-pega era a sua distração preferida. Lembra-se daquela vez em que subimos naquela pequena árvore próxima ao muro, na casa das jabuticabeiras? Você subiu tão rápido, que acabou caindo no quintal da vizinha, quando o galho para lá curvou. Parecia uma macaquinha branca se agarrando ao galhinho. Sempre que penso nisso dou risada sozinha e olhe que não tem ninguém para me acompanhar nas gargalhadas.
            Nada lhe aconteceu desta vez, mas você sempre acabava se metendo em confusão. Lembrei-me de quando mamãe chamou você para lhe dar banho - você era bem pequena ainda – e você, ao ver a toalha nas mãos dela, simplesmente escondeu-se embaixo da escrivaninha de meu pai, atrás da cadeira, que nem um gato medroso. Porém, não escapou do banho e dos xingos dela. Continua com preguiça de banhos?
            Aqui, como faz muito frio, quase o ano todo, e chove incessantemente como um dilúvio, tenho tomado banho uma vez por dia, às vezes, nem tomo; assim economizo água, he, he, ehe...
            E os treinos, como vão aí? Eu tenho feito dança para arejar a cabeça e aliviar o corpo. Estou também com vontade de entrar num grupo de teatro aqui perto de casa – que fica próxima à faculdade, assim não gasto com transporte, né?! – estou precisando desenvolver e aproveitar a minha criatividade, além de descontrair-me mais. E esta é a última carta que envio a você.
            Sabe Belinha, também sinto saudade dos meus pais e irmãos. Pena que eles não têm e-mail, é que fica muito caro telefonar sempre, e se tivessem computador ficaria mais barato. Sei que é difícil para você e não aprecia muito as comunicações via máquina, mas eu só uso quando necessário e não me deixo viciar. Faço pesquisas, leio sínteses de bons autores, visito alguns blogs de poesia, contos e crônicas, e é só. Também não mando correntes de orações, pois receio conterem vírus – que é uma praga só, e fica muito superficial e imposição; acho que a oração deve ser livre, espontânea, igual àquela vez em que você ficou com virose e foi internada, está se lembrando?
            Foi sim! Eu e minha mãe oramos por você durante os quatro dias de internação. Temíamos que fosse morrer. Pedimos aos santos, Francisco de Assis e outros, aos anjos guias e todo o resto das divindades. Graças a Deus recuperou-se! Estava tão magra, nada parava no seu estômago, vomitava tudo, além da diarréia. Deus me livre, não gosto nem de lembrar...
            É, minha linda, vivemos muitas coisas juntas, mas agora, aqui, tenho dificuldades de fazer verdadeiras amizades. Parece que sinto medo de me aproximar e confiar nas pessoas. Sei que boas amizades demoram a se solidificarem, só que, sinto-me sozinha, sem ninguém pra conversar. E você, já arrumou um “namoradinho”? Minha mãe falou que você estava de olho no Djavan da esquina. Como ele é? Cuidado heim, amiga! Não vai fazer igual à Paloma, que engravidou cedo e depois se complicou na criação do filho, sozinha.
            Desculpe-me por ficar lhe dando “lição de moral”, mas é que eu me preocupo com você; apesar da diferença de idade, sei que você é ingênua em relação a certas coisas e, dizem que quem ama cuida, então eu “cuido” de você.
            Não sei se já sabe, mas arrumei uma gatinha preta, muito fofa e carinhosa. Tem me feito companhia, só que têm dias em que ela some e reaparece do nada. É independente demais. Será que isso é bom?  Hoje penteei os cabelos dela igual eu escovava os seus, lembra-se, Belinha?! Espero que não fique enciumada, afinal, são amizades diferentes e ambas sinceras.
            Você não vai acreditar, mas, outro dia eu estava trocando os jornais que costumo colocar pra ela fazer xixi e cocô na lavanderia do apartamento e, de repente, vi uma notícia que me chamou a atenção, abaixei-me mais e quando vi, estava eu de quatro, lendo animadamente. Só assim mesmo pra eu ler jornais e me atualizar um pouquinho dos malefícios do mundo. Só eu mesma! E tem mais. Essa você vai gostar: quando a minha gata Nenê faz xixi bem encima da cara de algum bobo famoso e volúvel eu me divirto, aliás, coloco sempre a cara deles para o lado de cima. Se tiver imagens de alguém legal e altruísta, retiro o jornal antes de ser manchado pela gatinha.
            Bem, enfim, já contei coisas demais, sinto se lhe aborreci por algo inconveniente. Despeço-me com saudades e esperando que esta chegue brevemente até você e estou mandando gotículas do meu perfume preferido nesta.
            Belinha, minha fofa, não queria que soubesse por terceiros, mas como não sabe ler, mamãe vai lhe contar. Agora criei coragem, é isso. Não quero que fique triste, a vida continua sempre, sempre, mas...eu estou doente de verdade, estou morrendo.
                                                       Com todo amor e saudades,
                                                                     Líria, sua melhor amiga!
   P.S. - Dizem que o cão é o melhor amigo do homem. Eu lhe digo, de coração, que você, Belinha, é a melhor cachorra amiga da mulher.
           
                                     

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Esquete de teatro por mim elaborada no processo de criação da peça Nonoberto Nonemorto, do Grupo Andaime, 2000.



SERÁ?

            Lúcifer está no centro de um círculo com velas acesas e dialoga com Deus que está do lado de fora. Ambos nus. ( há uma música tocando )
            Deus- Eu te baní por que havia necessidade disso naquele momento.
            Lúcifer- Eu não queria nada de mais, somente um pouquinho mais de espaço e liberdade.
            Deus- O poder, desejo irrefreável que lameia a alma e corrompe  os instintos. Pois eu te pergunto: Esses pobres famintos, famigerados da guerra cruel e injusta, qual é a sua versão sobre eles? ( entram refugiados e retirantes da Guerra, em completa desolação e medo, com olhares que devoram e pedem ajuda)
            Lúcifer- Meu caro, é o destino dos homens, a procura vã de cada um se encontrar às custas do desencontro do outro. Mas o que podemos fazer? É inútil perseverar...
            Deus- Pois eu diria que é o mesmo motivo  causador da sua banição, e bem vês que em nada mudou.
            Lúcifer-  Quem te garante que o bem é sempre bem e o mesmo ocorra com o mal? O tempo não é linear,  já dizia a História que ele é circular e você não sabe da missa nem um terço.
            Deus- Nosso tempo é simplista, sumário e brutal. A contradição é às vezes bem vinda, mas  não subestime a minha própria História.  O que dirá tu desse surpreendente quadro? ( entram duas mulheres grávidas de um mesmo homem, trocam roupinhas e informações entre elas, sorriem).
            Deus- Uma engravidou depois de uma briga dos namorados, onde o rapaz a procurou  para afogar suas mágoas, sem saber que a namorada também já havia engravidado em seu período fértil há dez dias.
            Lúcifer – Eu sei, a consoladora era virgem e também havia se apaixonado por ele, mas o cio grita mais alto, é latente o tesão e a paixão.
            Deus- Como você bem deve saber, ele optou em voltar para a namorada, mas a outra parece não se importar com isso, o filho é a única coisa importante para ela.
            Lúcifer- É a deusa-mãe desafiando as contradições da vida, mas não vejo nenhum mérito na atitude deles, o cara é um canalha e com uma conversa boa, deu no que deu. Aliás, os seus seguidores estão se afundando na lama dos desencontros, das oposições e das guerras caladas que incendeiam as cidades do mundo todo
            Deus- Elas, as mulheres mães, estão se comunicando e conseguindo romper a barreira do preconceito, do egoísmo e do distanciamento impaciente, ele também, eu diria.
            Saem a duas. Lúcifer sai da roda, entra Deus.
Lúcifer- Posso errar e acertar, quantas vezes for necessário, o meu mérito será o mesmo, mas o que morre em teu nome e em tuas mãos não são poucos, e o número de descrentes se acelera. Se bem que eles não acreditam mais nem em você nem em mim.
            Deus- Essa melancolia avassaladora que você trás junto de ti, esse humor que ama o claro e o escuro ...
                Lucifer- Que lugar tem o amor em um mundo como o nosso? A energia universal está dispersa e perdida. Eu mesmo já não suporto visualizar os paradoxos e incoerências desses homens podres que dizes ter criado. Cuida de tua obra, por que eu não estou mais a fim de padecer com tanta ignorância ...
            Deus- A energia universal será focalizada e revertida para os canais vitais à vida na terra e em outras esferas. Os gangsters desse século não terão mais espaço para sobreviverem, e aí sim, será o momento de você se decidir,  pela última vez,  de que lado ficará.




quinta-feira, 7 de outubro de 2010

A VIAGEM (Profª Vanessa, alunos da 4ª série e Luzia)

            Outra esquete do Projeto Plantando Sonhos, na EMEF do Jardim Santo Antonio, 2003.

                                 
         Entra o motorista do caminhão (Jandir) levando várias pessoas, sozinhas ou com família, que estão se mudando para outro lugar mais distante, outra cidade ou Estado. Percorre o palco com um volante na mão, faz barulho de ronco do motor. Para. Os passageiros vão descendo e ocupando um espaço no palco; cada um carrega um tipo de objeto, que retira da mala, trouxa ou outro suporte. Algo que tenha significado para o personagem, que vão lembrando e contando fatos de sua vida, sonhos, costumes, suas origens, dificuldades, expectativas, e estabelecendo novas amizades na viagem.
Pedro- Saí de Campo Formoso, Bahia. Aqui em minha mala eu guardo sonhos!
Maria- Com o que você sonha? Se é que eu posso saber (come numa marmita)
Pedro- Sonhos. Pra comer no caminho (mostra os sonhos)
Maria- Palestina, Alagoas!
Osvaldo- Será que vai ser bom? Eu venho de Figueira, Paraná.( carrega um radinho e tenta achar a estação junto ao ouvido, de vez em quando dá uns tapas no rádio, conversa com ele como se fosse o melhor amigo).
Flavia (Criança, ela carrega brinquedos, está junto com a mãe que a abraça)- Será que eu vou gostar de lá? Farei amiguinhos?
Sara- (retira um pente, creme, espelho, pó de arroz e batom de um jornal e fica maquiando, concentrada).
         Vó, neta, bisneto (Eduardo) e um bebê de colo se despedem.
Vó- Vai com Deus, minha neta, e cuide bem da lindinha e do nosso pequeno Eduardo. Leve esses queijos pra comer depois; e nunca desanime, minha querida.  Lute, lute com dignidade até o fim...
Neta- Obrigada por tudo (beijam-se e abraçam-se. Vó sai, neta ocupa seu espaço, dá mamadeira para o nenê, carrega as malas e o menino uma malinha com brinquedos e chupeta).
João- Eu sou de Imperatriz, Maranhão. Se Deus quiser arrumarei logo um trabalho pra mandar as economias pra família (tira documentos velhos embrulhados num lenço, depois fica pensativo observando o nada).
Rosa- Viemos de carona, mas nenhum acidente com o caminhão, graças a Deus. AH! Eu venho de Altaneira, Ceará. (carrega uma trouxa de roupa e um tercinho, reza sempre).
Entra um vendedor ambulante de biscoitos, outras guloseimas e pinico, oferece às pessoas e repete o pregão: -“Comprem! Tem de tudo um pouco: biscoito, pinico e até um boneco louco. Comprem, comprem biscoito! É 1 por 5,  e 3 por 8!” Eu sou de Florestópolis, Paraná! (Repete o jargão, alguns compram. Ele é divertido e engraçado)
Meire- Dizem que em São Paulo faz muito frio. Será que eu aguento? ( traz uma mala cheia de roupas e  jóias, vai arrumando e verificando).
         O bisneto se aproxima da menina Flavia e conversam
Flavia- De onde você veio?
Bisneto (Eduardo)- Da barriga da minha mãe, oras!
Davi está acompanhado de sua esposa Marta. Ela carrega uma caixinha com fotos, ele desembrulha apenas um perfume e passa em si próprio e nela, que não aceita.
Davi- Meu pai é mineiro, minha mãe paulista, então somos misturados: Minas e São Paulo.
Marta- A capital está muito agitada e perigosa, vamos tentar a vida no interior...
Vera- é muito divertido mudar de cidade.  Parti há muito tempo  de Emilianópolis para o  Piracicamirim. Crenças? Só acredito que nós colhemos o que plantamos! Saudades? Tenho saudades das festas e folias na minha terrinha: o Boi, a umbigada, as amizades... (abre uma caixinha de música de dentro de sua mala velha)
Pedro- Eu vou plantar todos os meus sonhos!
Maria- Os sonhos? (espantada)
Pedro- Não. Os meus outros sonhos!
Rosa- Creio em Deus, e é isso!
João- Creio no trabalho, saúde e felicidade.
Meire- Costumes? Eu acho que o importante é passear e comer bem.    
Davi- Se tenho Superstição? Não ler depois de comer; faz mal pra vista!
Marta- é, dá sono, né velho!?...(ironia)
  (entrou em cena com outra roupa e personagem)- Tenho medo de coruja, e em 6ª feira 13, então?
Motorista (voltou em cena depois)- Tenho medo de alma penada e de sapato virado, Deus me livre!
Eduardo- Ai, jamais quero ver o bicho de 7 cabeças...
Flavia- E os bichos soltos na quaresma então...
         Dois jovens que dormiam, levantam-se e começam a batucar com algum instrumento e cantar (ver música).
         Todos cantam juntos, vão se abraçando, despedindo-se... é a chegada!