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sábado, 28 de agosto de 2010

Excerto do livro

As Duas Barrigas




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E assim o tempo foi caminhando, as duas barrigas aumentavam de volume, os bebês se agitando dentro delas, a cumplicidade crescia e aproximava as duas futuras mamães cujas afinidades refletiam o que elas tinham em comum. E não era pouco. O pai duplo, nem sempre estava presente nestas trocas de enxovais, de dúvidas, de receios e de ansiedades. Raquel preferia não vê-lo, tinha lá os seus motivos. Ocasionalmente os três compartilhavam a mesma conversa, mas nada com muita profundidade. Era bonito ver o relacionamento respeitoso que se estabeleceu. Nenhum dos três expressava o que realmente pensava sobre esta delicada situação em que se envolveram, mas sabiam que as crianças que estavam pra nascer mereciam todo o esforço de superação de mágoas ou rancores. As gestantes tinham consciência dessa necessidade. Ele, aparentemente também a tinha; na realidade, não se sabe. Talvez se saiba um dia?

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Luzia nada entendia de criança, nem de parto, muito menos de cesariana. Aprendera bem literatura, gostava de poesia, teatro, dança psicologia. De parto não sobrara muito tempo para conhecer ou gostar. Brincar de ser mulher não era seu hobby. Quando pequena optava por fazer cercas de gravetos e barbante e colocar vaquinhas dentro do pasto – pequenas mangas verdes com quatro pauzinhos encravados, simulando patas - punha porteira, lago e capim para as mesmas se deliciarem. Imitava porco na lama, vestida apenas com calcinha, cavava um buraco no chão, enchia d’água e fingia ser uma porquinha no lodo; saía de lá de cor marrom meio avermelhado, ao chamado de Dona Sílvia, que ficava meio confusa ao ver a filha com tantas artimanhas e criatividade. Exceto fazer bonecas dormirem ou se banharem: não as tinha. Costumava, mesmo disputando com as irmãs, pegar bonecas de milho direto no lindo milharal, podendo ainda escolher o tamanho e a cor do cabelinho: preto, ruivo, amarelo ou rosa. Roupa verde e com cheiro natural. Elas duravam algum tempo até ficarem murchas, e, em seguida, serem substituídas por outra. Aí esperar a próxima safra de milho. Resquícios de maternidade, talvez, o ato de fazer o afável cabritinho dormir em seu colo, quase todo final de tarde. Cantar para ele e depois devolvê-lo à mãe, já meio preguiçoso.

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